Quando eu era criança, ouvia me dizerem: não faça o mal, que o bem é que era bonito, que é legal. Sempre pensava: será que existe algum lugar onde é o contrário?
Aldous Huxley criou um lugar onde as coisas são assim, invertidas. O seu romance O macaco e a essência se passa numa sociedade onde fazer o mal é que bom. Huxley era um tanto viosionário.
“Só o homem perdoa, só uma sociedade superior qualificada pela consciência dos mais elevados sentimentos de humanidade é capaz de perdoar. Porque só uma sociedade que, por ter grandeza, é maior do que os seus inimigos é capaz de sobreviver.”
Li isso e, arco reflexo, pensei no livro. O discurso acima - que poderia ter sido pronunciado por um personagem huxeliano - foi proferido Cezar Peluso, presidente do STF, em referência à arguição da OAB sobre a aplicabilidade da lei da anistia àqueles que praticaram crimes pela manutenção do regime de excessão.
Seria cômico se não fosse trágico.
Fico a pensar. Perdoar as torturas, os sumiços, os sequestros? Quem são os tais inimigos a que o presidente do Supremo se refere? Se perdoar aqueles que praticaram crimes contra a humanidade faz parte dos de mais elevados sentimentos manidade, quais serão os mais baixos?
O relator do processo foi o senhor Eros Graus, aquele que tirou o governo do Maranhão das mãos do governador eleito pelos maranhenses e o devolveu à oligarquia Sarney.
Com os votos contrários dos ministros Ayres Brito e Ricardo Lewandowski, o STF se posicionou a favor da tortura, do sequestro, dos estupros e todos os crimes contra humanidade cometidos pelos apoiadores do regime.
Os sete ministros que votaram com o relator nos deram mais um título desonroso: nós somos o único país da América Latina que não julgou inválidas essas anistias. Quem lembra esse recorde, não sem pesar, é Fábio Konder Comparato, o jurista que propôs a arguição. Ele vai além, classifica a decisão do STF de 'escândalo internacional'.
O fato de não encararmos esse problema tem consequências. Uma delas é que a prática de tortura por parte de autoridades policiais dificilmente são apuradas e via de regra ficam impunes.
Outra é que a OEA abriu uma denúncia contra o Estado brasileiro por desrespeito aos direitos humanos. Ironia perversa, as famílias que tiveram entes desaparecidos ou torturados, por serem contribuintes, pagarão a defesa desta nossa posição atroz diante das cortes internacionais.
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